Jack Soul de Belém


Saio de casa por volta de umas uma e meia da tarde, sol a pino. Calça jeans e camisa social dobrada nas mangas. Ao chegar à esquina do ponto de ônibus, abruptamente o tempo fecha e um céu nebuloso e quase negro me indica que um dilúvio se aproxima. E antes da primeira gota de suor cair do meu rosto, a gota da chuva cai e se desfaz na minha camisa. Não há proteção no ponto, apenas uma placa indicativa de que o ônibus deve parar. Vinte minutos após eu sair de casa a chuva ainda não havia cessado e todos que estão no ponto estão encharcados, inclusive eu que ainda tento ficar debaixo do plástico do vendedor de bombons. Ônibus lotado, adentro nele. Muito sufoco e janelas fechadas. Um empurra-empurra intermitente. Pessoas xingando os que entram molhados. Clima de estresse, todo mundo aparentemente estressado. Uma velha começa a bater nas janelas e portas do ônibus, gritando que o motorista havia passado a sua parada. O motorista retruca com grosseria e é vaiado pelos passageiros. Todas as pessoas estão suadas, sujas e por isso exalam pelas axilas, principalmente. Uma gorda se atola no meio do corredor, os passageiros se espremem e ela com muita dificuldade consegue passar. Quarenta e cinco minutos depois eu desço do ônibus, que já não está tão lotado. Ando depressa pelas calçadas largas da rua e logo uma mendiga me aborda e antes que ela peça dinheiro faço 'não' com o dedo, ela resmunga e depois me xinga, segue me xingando até eu entrar numa lanchonete. Peço um hambúrguer com fritas e passo a vista no jornal: "Confronto com a Polícia deixa três vítimas fatais." Continuo até ver uma casa lotérica, há cartolinas penduradas anunciando o prêmio acumulado de trinta e cinco milhões, meu subconsciente sabe o que se passa comigo e sabe que eu não ganharei, porém meu consciente é tolo, entro na lotérica e preencho dois jogos: uma megasena e uma loto. Saio ligeiramente e o vapor do asfalto molhado começa a perpassar as minhas narinas. Compro um café quente, sorvo bem devagar, e sigo meu caminho. Entro na primeira loja de uma galeria e deixo meu currículo, a mulher mal amada amassa e joga num canto qualquer, quando abro mais os olhos pra ela, a mesma resmunga um milhão de coisas. Atravesso o semáforo enquanto dois garotos fazem malabares na rua, lhes jogo uma moeda de longe e eles me devolvem um "obrigado" que eu não ouvia há tempos. Um turista aparentemente porre ou drogado me pede uma informação de onde fica o seu hotel, eu digo que não sei e mais a frente ele é assaltado por três crianças. Pego o ônibus de volta e fico preso no engarrafamento por volta de umas duas horas. Desço, estou perto de casa, caminho duas quadras, compro uma batata frita e alguns dvd's piratas. Já que sou de Belém.

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"Essas palavras que escrevo me protegem da completa loucura." (Charles Bukowski)